Ensaio Ana Maria Lozano, 02/2005

Do idiossincrático ao ideológico

François Bucher usa, versatilmente, dois diferentes suportes de acordo com as exigências do problema indagado. Assim, sua obra se enquadra nas premissas definidas não pelo suporte que usa, e mas por sua postura, sempre analítica de convenções culturais manifestadas em âmbitos populares e cotidianos, em diversos usos e políticas da imagem. 

Sua formação como artista plástico e seu desempenho no campo teórico designam sua maneira de operar com sólidas ferramentas. Ser um artista que trabalha entre a Colômbia e os Estados Unidos permite que ele habite contextos culturais diversos, os quais fornecem informações e relações necessárias para suas investigações de pensador cultural. Nesses âmbitos, com lucidez, Bucher detecta conformações idiossincráticas e locais em paisagens aparentemente globalizadas e homogeneizadas. 

Em um de seus trabalhos, White balance, fundamental para o reconhecimento de seu trabalho em âmbitos internacionais, localiza a obra nos dias seguintes aos atentados às Torres Gêmeas, realizando um trabalho híbrido, composto de vários formatos audiovisuais, que vão desde o documental até a captura de imagens televisivas e áudio, construindo a partir de um olhar incisivo e autoral um registro aterrador que explicitamente converte em ondas xenofóbicas, diversas manifestações de racismo, estigmatizações e satanizações do outro, temas que no momento político atual se encontram extremamente marcados pela emocionalidade que os meios de comunicação captam perigosamente. 

A obra de Bucher faz voltar o olhar aos atentados e repensar muitos dos lugares-comuns que, desde o acontecimento, se cotidianizaram para dar pé a discursos belicistas e fundamentalistas. Em White balance, o sujeito visibilizado é o do cotidiano, mulheres e homens comuns que expõem suas opiniões e expressam suas emoções. Ao apresentar-se em um meio autônomo, essas opiniões exibem com crueza posturas ideológicas sorrateiramente inscritas em um discurso de poder, profundamente provocadoras de respostas e reações. O olhar crítico de Bucher, sua capacidade de se mover anfibiamente, com recursos que partem da mistura de diferentes meios, permite que seu enfoque penetre hiatos presentes nos discursos hegemônicos, projetando suas fissuras em direção ao exterior.