Curadoria convidada |

Artistas

Obras

Texto de curadoria Jean-Paul Tréfois, 1990

Carré Noir/RTBF

É bom lembrar mais uma vez que a Bélgica é um pequeno país de dez milhões de habitantes onde coexistem duas comunidades de cultura e língua totalmente diferentes: a comunidade de língua francesa e a comunidade flamenga, que não tiveram o mesmo desenvolvimento no decorrer da história de sua produção cinematográfica, televisiva e videográfica.

Flandres desenvolveu sobretudo uma política cultural que deveria refletir sua necessidade, compreensiva e legítima, de formar uma cultura flamenga, sob o peso da cultura francesa, da qual se prevaleciam às vezes com arrogância, os habitantes do sul da Bélgica. A televisão flamenga (BRT) se encontra em Bruxelas, embora essa cidade seja majoritariamente de língua francesa. Já a televisão de expressão francesa (RTBF), pelo contrário, dispersou seus centros de produção em Bruxelas e Wallonie.

Da mesma maneira, o auxílio público se passou de forma muito diferente nas duas partes do país, sendo que a região flamenga privilegiava algumas realizações mais prestigiosas, enquanto a parte francesa, um pouco menos perturbada pelos problemas de identidade, permitiu com mais flexibilidade a eclosão de talentos cujo renome ultrapassou em muito as fronteiras da Bélgica: de André Delvaux e Chantal Akerman, sem esquecer os produtores estrangeiros que acolheu na sua escola de reputação internacional, o INSAS, como Mary Jimenez e Michel Khlefi.

O vídeo, enfim, conhece essa mesma diferença: o desinteresse quase total de Flandres por um segmento considerado menor e pouco rentável, tanto cultural quanto econômico, e um desenvolvimento notável (dois primeiros prêmios sucessivos em Montbéliard) do vídeo na região de Wallonie mesmo se, para cúmulo da ironia e do paradoxo, às vezes seja realizado com videastas estrangeiros.

Portanto, foi na região francesa que o vídeo nasceu na Bélgica, favorecido por três fatores, ao mesmo tempo técnicos, econômicos e culturais. A Bélgica, como se sabe, tem a originalidade de ter sido o primeiro país totalmente coberto por TV a cabo da Europa, mas foi na Wallonie que esta tecnologia se instalou em primeiro lugar, tendo se utilizado de suas possibilidades de difusão local, multiplicando-se, em meados dos anos 70, as televisões comunitárias. Aliás, alguns videastas fizeram os seus primeiros ensaios nessas televisões (Jean-Claude Riga ou Rob Rombout, ambos ganhadores do prêmio em Montbéliard).

A ausência de indústria cinematográfica na Bélgica levou os produtores independentes a se associarem em grupos de produção audiovisual, meio públicos, meio privados, e que participaram na comunidade belga de língua francesa, do desenvolvimento de uma vídeo-criação.

Um papel essencial na produção do vídeo na Bélgica cabe ao programa de televisão “Vidéographie”, que em meados dos anos 70 transmitiu, a partir do centro da RTBF de Liège, pela primeira vez na Europa, obras integrais dos pioneiros do vídeo americano, como Nam June Paik, Les Vaskula, P. Campus.

Em seguida, “Vidéographie” mudou duas vezes de nome. A emissão da criação da RTBF foi rebatizada “Lumiére Bleue” e mais recentemente “Carré Noir”. O princípio da programação sempre foi o mesmo; dar uma ajuda financeira e/ou apoio técnico a produções independentes.

8th Fotoptica Internacional Video Festival. 09 a 15 de Novembro de 1990. p. 21.