Entrevista 2003
Entrevista concedida por Francisca Caporali, Rafael Morado, Ricardo Portilho e Joana Meniconi ao 14º Videobrasil
A relação entre arte e política é ao mesmo tempo rica e conflituosa. Como você percebe esta relação no caso específico do seu trabalho?
Nosso trabalho The Same Old Choice se encontra no meio dessa encruzilhada: arte e política. Embora achemos que ele penda mais para um dos pólos, o da política. A idéia central do vídeo não é ser plafentário e nem absoluto. Nosso objetivo foi levantar algumas questões sobre o nosso, tão aclamado pela mídia local e mundial, sistema democrático. Por isso, The Same Old Choice exigiu uma maior objetividade, precisávamos nos ater em alguns fatos do nosso cenário político e econômico para conseguirmos levantar tais questões. O caráter polissêmico, isto é, de significado mais aberto a interpretações, fundamental em um trabalho artístico, ficou em segundo plano. Na verdade, está mais presente no tratamento gráfico e estético do vídeo.
As tecnologias da imagem e da informação participam de estratégias de controle e vigilância, sutis (ou não) e generalizadas. Diante desta realidade, qual seria , a seu ver, o papel da arte em contextos midiáticos?
Acreditamos que o papel da arte eletrônica, a que justamente se apóia em suportes tecnológicos utilizados pela grande mídia, é subverter o próprio meio. A arte eletrônica deve tentar utilizar o espaço midiático para se sustentar. É usar, por exemplo, os recursos da televisão e da internet, desconstruí-los, de modo a deslocar os interlocutores de um lugar confortavelmente edificado pela mesmice da linguagem. Em nosso trabalho manipulamos os discursos dos candidatos que também já haviam sido, previamente, manipulados pelos assessores de marketing político desses candidatos. Quais os recursos para fazer essa manipulação? Os que aprendemos com a observação (in)voluntária da linguagem televisão, cortes rápidos, descontextualização de falas, entre outros.
No contexto sócio-político e cultural contemporâneo, as identidades locais se reconfiguram em tensão com os fluxos globais. Inserida neste processo, a arte eletrônica participa como um campo aberto à experimentação e expressão de novas formas de subjetividade. Como essas questões se manifestam em seu trabalho?
Apesar da idéia do vídeo ter surgido, a priori, diante da necessidade de afirmarmos uma parte de nossa identidade, ou melhor, desmitificá-la diante de um estrangeiro, esse ponto acabou se tornando mais um pano de fundo de The Same Old Choice do que uma questão central. Vale aqui dizer que a idéia do trabalho se consolidou quando estivemos em contato com um videomaker canadense, Stephen Marshall, que estava muito empolgado com o fato de um governo de esquerda poder subir ao poder brasileiro pelas vias democráticas. Estava impressionado como um país em desenvolvimento, com grande instabilidade econômica, conseguia realizar umas eleições de forma tão clara e eficiente. Então, a questão da identidade brasileira no trabalho passa por aí, tentamos mostrar como que a democracia não pode ser resumida à urna e à apuração de votos, também brincamos, no clip Come to Brazil and bring your dollars com o imaginário do estrangeiro a respeito do Brasil.
Associação Cultural Videobrasil