Curadoria convidada |

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Obras

Texto de curadoria Carlota Alvarez Basso, 1994

A Palavra, a Imagem e a Música: as três graças

No princípio era o verbo...

Seria necessário indagar sobre isto aos três autores que apresentamos no 10º Videobrasil. Para estes artistas, a Palavra, a Imagem, e a Música aparecem simultaneamente, não há hierarquia entre os três elementos constituintes de suas video-criações, apesar desses autores serem três exemplos opostos e complementares do que podernos chamar Videopoesia. Vindo de campos plásticos totalmente distantes encontraram-se no video, uma terra de ninguém, que tem a grande virtude de dar abrigo aos exilados, um território sem fronteiras que produz frutíferos encontros entre criadores quase irreconciliáveis como Anton Reixa, Francisco Ruiz de Infante e Rogelio Lopez Cuenca.

O primeiro inicia sua caminhada com uma formação plástica que o leva ao cinema (brevemente) e ao vídeo, combinando a imagem com textos literários de carater poético. O segundo, com uma formação acadêmica-literária, dirige seus passos à música de rock, ao teatro-performance e por fim à Videopoesia. E por último o terceiro que, a partir da pintura e através da análise semiótica da linguagem publicitária, desemboca em vídeo-colagens que tem a estrutura de livros de poesia.

Na obra de Francisco Ruiz de Infante o texto, a imagem e o som são construídos simultaneamente, baseados em uma idéia que funciona como esboço de roteiro. Os três elementos são indivisíveis e mantém entre si uma relação de equilíbrio instável já que, segundo o autor, no momento em que um dos elementos se evidencia mais que os outros, indubitavelmente adquire vida própria e se converte em um texto a ser publicado, como urn livro ou catálogo, ou em uma peça musical. A fronteira é muito frágil "y no hay dos sin tres". Seus videos são obras de leitura e relevo quase matéricos, nos quais a imagem, a música e o texto formam um todo carregado de força centrípeta, que dá voltas em torno de temas recorrentes e que Ruiz Infante reconhece como seus: a Infãncia, a Religião, o Tempo, a Culpabilidade, a História, e a Morte.

A obra de Anton Reixa parte de parâmetros mais lúdicos mas não menos profundos. Poderia se dizer que para ele o uso da Palavra é parte de um discurso politico: o nacionalismo galego. A reivindicação de uma língua como característica nacional é uma exigência histórica, porém o inovador na obra de Reixa é o resultado formal deste postulado: fazer rock and roll e performances em galego. Para isto desde o início de sua "luta" surge o vídeo como meio de registrar suas acões-manifestações e fazê-las chegar mais longe. Os resultados, além de levarem suas canções muito além das fronteiras da Galícia, foram obras como Salvamento e Socorrismo, uma peca histórica dentro da videoarte na Espanha, em que Reixa recita poemas de seu Iivro História do Rock and Roll.

Como uma leitura extremamente atual, seu vídeo Ringo-Rango é a assimilação do Rap como poesia da nossa época. Segundo Reixa, os cantores de Rap são os trovadores do século XXI. Eles são os verdadeiros catalizadores e transmissores dos conflitos sociais e da vida cotidiana. Neste vídeo o artista recita continuamente em um cenário pequenos textos e poemas, alguns deles inspirados nos programas das consultas radiofônicas em que colabora frequentemente. Não há fronteiras nem formatos, tudo é poesia.

A obra de Rogelio Lopez Cuenca é a mais sui-generis. Seus primeiros contatos com o vídeo foram no início de seu trabaIho, logo o abandonando por uma madura carreira como artista plástico. Não obstante a palavra, a linguagem e a iconografia publicitária sempre estarem presentes em seu discurso artístico. A videoinstalacão que apresentamos neste festival, Home Swept Hole, surge como projeto de livro e video para uma exibição em Málaga.

Depois de uma longa investigação sobre casas e moradias - feitas em revistas de decoração, livros de arquitetura e livros de gramática -, decide concretizar os resultados de sua busca em um video de duas horas e meia de duração, cujo texto, poliglota e confuso, foi publicado em forma de livro. O resultado é uma colagem visual e uma poética de remistura, compostas por imagens e textos carregados de uma velada mensagem política não isenta de humor negro.

É para mim um grande orgulho ter a oportunidade de apresentar esta explosiva combinação de artistas espanhóis, que ao unir forças expressivas abrem novos caminhos e bombardeiam fronteiras lingüísticas e artísticas. Videopoesia, Video-Performance, Video-Collage, Video-Rock and Roll, Video-Diário de Viagem, Video-Anúncio Publicitário, Video-Video-Video. Três enfoques totalmente distintos de um meio criativo. A Palavra os cria e o Vídeo os une.

ASSOCIAÇÃO CULTURAL VIDEOBRASIL. "10º Videobrasil: Festival Internacional de Arte Eletrônica": de 20 a 25 de novembro de 1994, São Paulo-SP, 1994.