A videoinstalação, cada vez mais reconhecida pelas instituições artísticas, utiliza-se da tecnologia da imagem eletrônica como base para elaborar uma arte contemporânea. As relações entre espectador e monitor mudam em uma videoinstalação, pois a imagem em duas dimensões sai do seu plano e se expande até o espaço exterior para levar o tempo e o movimento ao cenário. As 11 videoinstalações apresentadas, bastante diversas entre si, mostram as amplas possibilidades do que pode ser feito e são uma rara oportunidade de se conhecer o trabalho de artistas internacionalmente consagrados.

The Shape of Pain é uma videoinstalação de Breda Bedan e Hrvoje Horvatic composta por fontes luminosas intermitentes, projeção de imagens em vídeo e duas toneladas de vidro quebrado que cobriu o chão. A dupla de artistas iuguslavos explorou de forma radical uma participação física e corporal dos visitantes, integrando elementos simbólicos e sensoriais.

Artistas

Obras

Texto de curadoria John Wood, 1994

The Shape of Pain

O trabalho de Breda Beban e Hrvoje Horvatic é caracterizado por fortes emoções e, ao mesmo tempo, por um auto-controle ritualístico e posição de abandono próprio, que resulta em dimensões altamente metafísicas em cada peça. Com frequência referidos como “os Tarkovksy do vídeo”, eles desenvolveram um estilo altamente sintonizado que é notável não pela técnica do espetáculo, mas por sua sutileza e dominação.

Seus primeiros vídeos, apenas para tela, esboçaram a sua inspiração na rica herança cultural da Europa Central (da pintura Bizantina à arte corporal). Ao contrário da maioria da arte contemporânea, o uso das imagens e simbolismo não era um simples pasticho, mas uma tentativa de situar o seu próprio trabalho dentro de uma perspectiva cultural que tem um passado, assim como um presente eterno, habitado por sociedades consumidoras. Essas primeiras fitas eram lentas, evocativas, meditativas, demoradas em nossa percepção de tempo e espaço e caracterizadas por longas tomadas, câmera fixa, súbitas mudanças e luz e movimentos ritualísticos repetitivos de Breda Beban num vestuário rebuscado.

Em 1989, após 9 obras fortes de vídeo (produzidas em apenas três anos), a peça intitulada Geography revelou uma mudança. A imagem tinha uma presença mais singular; havia menos sequências de desempenhos e os vestuários desapareceram. Num caminho quase profético, Geography prognosticou mudanças dramáticas e trágicas que estavam por acontecer em seu país nativo, antecipando a nova tensão de perda e deslocamento que evoluiu, atingindo o seu cume na videoinstalação The Shape of Pain (A Forma da Dor), que estreou na Art Gallery of New South Wales, em Sydney, em 1992.

The Shape of Pain é uma rigorosa e poderosa peça em muitos sentidos. Há uma forte experiência física envolvida quando o observador percorre uma das mais expressivas instalações construídas nos recentes anos. O chão é completamente coberto por uma camada fina de vidro quebrado, e quando a pessoa executa o simples ato de entrar no espaço da instalação, o vidro começa a quebrar sob os seus pés, quase instantaneamente provocando/criando sensações desconfortáveis e temor.

No momento em que todo o corpo está no processo de se ajustar ao som do vidro quebrando e à atmosfera obscura de toda a peça, a pessoa instintivamente prossegue em direção ao centro do espaço, onde um quadrado vermelho brilhante começa a aparecer lentamente no chão. Quando os olhos se acostumam com sua presença e começam a seguir a luz que suavemente reflete a si mesma por toda a superfície de vidro, o quadrado vermelho começa a sumir em silêncio completo.

Os poucos segundos próximos devem vir como uma surpresa, porque são projetadas no chão – substituindo o quadrado vermelho – lindas tomadas de imagens de vídeo, que começam a fluir de uma a outra, acompanhadas por um forte som de percussão.

Então, subitamente, a imagem de uma lâmina – cortando lentamente a palma de uma mão, acompanhando a linha da vida – quase corta o olho do espectador. Exposta à vulnerabilidade da pele, a mente imediatamente reconhece o corte afiado de cada peça de vidro quebrado (o mesmo vidro sobre o qual a pessoa ainda está de pé), e retorna ao temor inicial e à noção definitiva de que um de nossos maiores temores é experimentar a dor.

As imagens de vídeo e o som de percussão desaparecem tão subitamente como começam. Mais uma vez o quadrado vermelho começa a se construir lentamente, o silêncio se torna ainda mais significativo que antes e a pessoa se torna consciente de que a vibrante cor escura das paredes tem a qualidade única aveludada e acinzentada de marcas de chamas.

Apenas tocando-a a pessoa pode deixar um traço vivo e destruir sua superfície cuidadosamente assentada. Após experimentar The Shape of Pain, é preciso um tempo para encaixar todos os elementos que contribuem para o poder dessa peça. No nível formal há um entendimento engenhoso dos materiais usados para construir a instalação: a mídia eletrônica é usada como fonte de iluminação, a camada de vidro quebrado no chão como superfície que absorve a luz. Mais do que tudo, há a capacidade ímpar de Beban e Horvatic de comunicar a dramática e trágica experiência pessoal através de um sublime, quase alquímico, empreendimento artístico, que atua diretamente em nossa própria existência 

ASSOCIAÇÃO CULTURAL VIDEOBRASIL. "10º Videobrasil: Festival Internacional de Arte Eletrônica": de 20 a 25 de novembro de 1994, São Paulo-SP, 1994.