Curadoria convidada |

A exposição A Arte na Trama Eletrônica reuniu cinco grafistas do Videotexto. A mostra teve a participação e a organização de Rodolfo Cittadino – artista egípcio de origem italiana e radicado no Brasil, um dos pioneiros a pesquisar as potencialidades e o desenvolvimento da arte por meio do Videotexto.

Além de trabalhos de sua autoria, Cittadino trouxe obras de quatro pioneiros da "arte da trama": Benjamin Marques (português radicado na França), Lie Liong Khing (indonésio radicado no Brasil), Nelson das Neves (brasileiro) e Verginio Zaniboni Netto (brasileiro).

Painéis fotográficos e planilhas se encarregaram da parte didática do evento, demonstrando passo a passo todo o processo criativo até chegar ao produto final, exibido no Videotexto.

Artistas

Texto crítico Lino H., 2013

Traduzindo computerese

1. Fazer arte com computador é usar os materiais historicamente disponíveis, tentando unir forças produtivas e relações de produção.

2. Para se fazer essa união, é preciso mergulhar fundo no material para dele extrair conhecimento. No computador, significa criar a partir dos próprios comandos que ele oferece, a partir de sua estrutura lógica, a partir de um programa.

3. Ao ser criada como um programa, a arte por computador participa, ao mesmo tempo, de dois momentos: o momento de sua autonomia e unicidade perante as outras criações artísticas (já que só as obras com computador são criadas através de um programa) e o momento de sua assimilação perante o mundo real, pois ser um programa é uma característica de todas as coisas que um computador usa como mediação entre si mesmo e a produção.

4. Sendo um programa, a arte por computador adquire características próprias: as imagens que gera são sempre diferentes umas das outras e diferentes na sequência em que aparecem. Isto porque os dados que vão compor a imagem são processados a cada momento de maneira diferente, através do uso de um comando que só o computador dispõe, que manipula as imagens de maneira aleatória. Como os resultados de resultados de um lançar de dados. Como acontece com todos os programas.

5. Dessa forma, a arte por computador reflete um aspecto do capitalismo tardio: procurando se diversificar, apresenta-se a cada momento de maneira diferente. Tal como o capitalismo, persegue a produção integral, infinita, a sua total auto-reprodução, sem interferências, Mesmo diferente a cada vez, sua estrutura, seu intento, é sempre o mesmo.

6. Procurando unir forças produtivas e relações de produção, procurando sua autonomia, a arte por computador, ao tentar extrair novos conhecimentos de si mesma e do mundo que a rodeia, descobre que reflete o atual estágio da divisão dessa relação, que estão e continuam separados. Eis o sei momento de verdade.

7. Culpo de dido/mea culpa: ao descobrir-se um reflexo dessa situação, a arte por computador não resiste à sua própria denúncia, envergonha-se de ser um reflexo quando procurava ser autônoma e então sucumbe. É por isso que as imagens são efêmeras, sumindo, escapando ao se querer fixá-las, acumulá-las. Elas só podem ser observadas enquanto processo, processo de produção, work in progress. Imprevisíveis em sua aparição, como no lançar de dados. E é assim que elas procuram escapar do controle do mundo administrado. Porém esse mesmo mundo as controla enquanto programas. Elas estão programadas para serem imprevisíveis. Mas é só o fato de serem assim que lhes confere aquele momento de verdade.

8. Apesar de tudo, a arte por computador teima em se fixar no mundo que a engendra e que ao mesmo tempo a faz sucumbir. É por isso que mesmo desaparecendo ela procura novamente se firmar e assim novas imagens são produzidas, como se estivesse à procura de uma nova síntese entre forças produtivas e relações de produção. Só que já sabemos que essa síntese não vai existir e por isso  o ciclo não acaba.

9. Cada momento de aparição dos programas na tela é um fragmento do processo de produção das imagens. A sua reprodução diferenciada é uma das maneiras pelas quais a arte por computador procura compensar essa fragmentação, seja em si mesma, seja com a ajuda do suporte. Dai o caleidoscópio: imagens iguais entre si, embora orientados diferentemente e reproduzidas num mesmo espaço-tempo. Mercadorias sem valor, tornadas disponíveis seja pela divisão das forças produtivas e das relações de produção, seja pela sue reprodução infinita, é somente essa reprodução que lhes confere significado, ou seja, um valor.

10. Se todo documento da civilização é também um documento da barbárie, então, barbárie por barbárie, sou mais a arte por computador.