Entrevista 2003

Entrevista concedida por Laendro Vieira e Mariana Meloni ao 14º Videobrasil

Durante o festival estaremos discutindo as questões do deslocamento e dos processos nômades como imagens e ações emblemáticas da situação política e cultural contemporânea. Como você reflete isso no painel da arte eletrônica? Este é um tema de interesse em sua obra?

As questões do deslocamento parecem intensificar-se com a possibilidade de utilização das novas redes informacionais, e neste contexto, de uma cultura digital, a própria representação torna-se um processo nômade, ao transitar pelas vias do ciberespaço e ser manipulada pelos usuários, rompendo com o claustrofóbico espaço do cubo branco.

A relação entre arte e política é ao mesmo tempo rica e conflituosa. Como você percebe esta relação no caso específico do seu trabalho?

Percebemos a relação arte-política como uma evidência em nossos projetos, e acreditamos ser inconcebível pensar uma sem a outra. O artista que não reconhece isso, ou que busca na alienação a estratégia poética para agradar ou não as curadorias, é a encarnação do analfabeto político de Brecht.

As tecnologias da imagem e da informação participam de estratégias de controle e vigilância, sutis (ou não) e generalizadas. Diante desta realidade, qual seria , a seu ver, o papel da arte em contextos midiáticos?

Chamar a atenção para este fato, ainda que com o risco de instaurar a paranóia, além de, é claro, reutilizar estes mesmos dispositivos de controle para operar ao reverso, como nas performances para câmeras de vigilância realizadas por grupos independentes de mídia tática, por exemplo.

No contexto sócio-político e cultural contemporâneo, as identidades locais se reconfiguram em tensão com os fluxos globais. Inserida neste processo, a arte eletrônica participa como um campo aberto à experimentação e expressão de novas formas de subjetividade. Como essas questões se manifestam em seu trabalho?

As novas formas de subjetividade propriciadas pela imagem eletrônica são ótimos exemplos para evidenciar a fragmentação e o deslocamento que abrange grande parte de nossa sociedade contemporânea. Dentro desse contexto, há uma incessante busca pela identidade, que, por sua vez, revela-se através do outro, de um eu performatizado e construído para a câmera. Essas questões permeiam nosso trabalho no sentido de mapear alguns modos de auto-representação na história do vídeo brasileiro, no projeto Auto-imagem em vídeo; e de propiciar um espaço de redes sociais e intercâmbio entre produtores independentes, no que se refere ao projeto Brócolis VHS - video homeless system.

Atualmente, verifica-se nas culturas locais o desafio de reinventar as memórias pessoais e coletivas, sem deixar que elas se esvaziem frente aos fluxos de comunicação global. A seu ver, como este desafio se traduz nas experiências da artemídia?

Interessa sim. O corpo manifesta-se como uma metáfora da máquina pois há uma nova sensibilidade no ar. É o corpo do realizador que está presente em todos esses vídeos do Projeto Auto-imagem em Vídeo.

Associação Cultural Videobrasil