É difícil datar com precisão o surgimento da performance. Dos cabarés dadaístas do início do século 20 à contracultura dos anos 1960, foram alguns os momentos cruciais na consolidação dessa arte viva, em que um indivíduo cria uma trama específica de tempo e espaço a partir do corpo. Efêmera, irreprodutível, arriscada, perturbadora, imprevisível, a performance desconstrói paradigmas de exibição, mercantilização e colecionismo.Veículo de artivismos e de movimentos antiarte, desafia o que é palatável, domesticado, uníssono. 

A exemplo da caminhada do modernista Flávio de Carvalho em trajes tropicais pelo centro de São Paulo, em 1956, tida como marco zero da performance no Brasil, os atos fundadores dessa linguagem só chegaram até nós em imagens estáticas. A partir da década de 1960, o recurso ao vídeo – adotado como meio essencialmente experimental no cenário da arte conceitual, pop e minimalista – permite não só registrar a performance, mas também explorar as afinidades poéticas e políticas entre os dois campos. O corpo performa para a câmera; a câmera inscreve o acontecimento.

Nos países do Sul global, em meio à violência de Estado e à herança colonial, artistas como Melati Suryodarmo, Marcello Mercado, Coco Fusco, Frente 3 de Fevereiro e Luiz de Abreu plasmam corpo e imagem em uma produção que é signo de vida contra as políticas da morte. No programa principal desta exposição, eles manobram de formas diversas o repertório da performance para trazer para o próprio corpo o enfrentamento de temas urgentes, como racismo estrutural, terrorismo estatal e violência de gênero. 

Desde sua primeira edição, em 1983, o Videobrasil oferece à performance um espaço inédito no cenário brasileiro; mais tarde, passa a comissionar projetos performáticos e coloca a linguagem no centro de uma edição temática. A partir de 2011, acolhe a performance em sua mostra principal. Registros selecionados entre os cerca de duzentos reunidos pelo Acervo Videobrasil compõem os quatro programas que ilustram a linha do tempo exposta aqui. Ela ilumina alguns dos rumos tomados pela performance em quatro décadas de diálogo com o vídeo. Incorporando música, teatro, dança, artes visuais e intervenção urbana, a linguagem se hibridiza; olhando para os rituais religiosos, convoca seu poder de cura; e, replicando a si mesma, ironiza sua inexorável objetificação. Variantes únicas entre as infinitas possíveis, reclamam sua potência disruptiva num concerto desconcertante.