Ficha técnica complementar

participação - Marília

colaboração - Fred Pessoa, Martin Heimann, D. Russel e Rosie Hae Kim

Texto de apresentação 2001

Coverman

Esquemáticos, com recomendações que devem ser seguidas para preservar a vida e o corpo, manuais de sobrevivência e primeiros socorros inspiram o trabalho de Alexandre da Cunha, que apresenta a performance Coverman. Assim como em outras de suas obras, o corpo desempenha papel central na performance: sua fragilidade, a vulnerabilidade que, às vezes, nos obriga a buscar reparo e manipulação. Coverman acontece quando um colaborador convidado aceita participar da performance, que consiste em uma sequência de movimentos cujas referências são procedimentos de cura e tratamento do corpo. Caberá a cada participante e espectador traçar as associações que, muitas vezes, resultam em trajetórias lineares, como numa narrativa: massagens, rituais de cura, ou mesmo uma autópsia podem estar entre as ideias envolvidas. Ninguém é induzido a ter uma leitura única e determinada: as ações apenas sugerem eventos em que o corpo, centro da atenção, é assistido. Em algumas de suas obras, o envolvimento também pode ser físico além de literal, como nas práticas em que o corpo é enfaixado. 

Alexandre da Cunha, artista nascido em 1969 no Rio de Janeiro, hoje baseado em Londres e representado no Brasil pela Galeria Luiza Strina, lembra que, sem seguir um roteiro predeterminado, a performance permite aos espectadores que imaginem narrativas, atribuindo personagens aos participantes. Ao deixar que o artista interaja fisicamente com seu corpo, o participante estabelece uma imediata relação de confiança, mas, também, de tensão: o corpo, afinal, é uma espécie de fronteira-chave para a maioria das pessoas. Talvez por isso o trabalho de Alexandre da Cunha já tenha sido considerado um seguidor da arte relacional proposta por Lygia Clark.

As performances de Alexandre da Cunha são registradas em vídeo e polaroids. Inicialmente pensados como registros de um determinado momento que permitem criar e recriar leituras sobre o evento, eles ganharam o status de obras autônomas, que podem ser apresentadas independentemente. Em sua trajetória, o artista sempre teve o corpo como objeto e preocupação centrais: o corpo e a interação dos corpos dos performers. “As performances abriram outras direções no corpo do trabalho, permitindo experimentar diferentes combinações de meios, explorando o diálogo entre performance e objeto”, diz o artista. Ele também vem utilizando em trabalhos recentes – como Stretcher, de 2000 – objetos descartados como escovas e roupas. Inventa novos objetos que, contudo, parecem ter o abandono como destino: “A ideia original de jogar algo fora está ligada à experiência da melancolia ou da frustração. Minha tarefa é transformar o lixo em objetos funcionais. Mas, inevitavelmente, essas invenções parecem ser inúteis e, talvez, nem mesmo desejáveis. Com objetos jogados fora crio uma narrativa que fala sobre a subsequente perda do objeto, inicialmente pelo fato de ter sido descartado, depois por estar preso em sua própria des(funcionalidade)”. Em um trabalho deste ano, Shelter, Alexandre da Cunha incorpora também uma investigação sobre a memória do corpo. Vestígios de seu próprio corpo em acomodações temporárias. A proposta é construir peças maiores como tendas, usando cobertores, sacos de dormir e móveis usados.

ASSOCIAÇÃO CULTURAL VIDEOBRASIL, "13º Videobrasil": de 19 a 23 de setembro de 2001, p. 200 e 201, São Paulo, SP, 2001.