“Os olhos traem”, parece alertar a cada instante Juan-Pedro Fabra Guemberena, do alto dos penhascos e em meio às densas florestas nórdicas de seus vídeos, que são muito mais do que paisagens e estão longe de representar a saída bucólica para um mundo perfeito ou ingênuo.
Exilado na Suécia quando criança, em conse qüência da ditadura uruguaia, o artista hoje matiza de sombras e incertezas os cenários que ergue e que têm a majestade da natureza como aliada. Ali o homem se funde, vira solo, rocha ou folhagem. O quadro não oculta nada, mas exige que o tempo e a perspicácia do observador revelem aos poucos os mistérios e as surpresas que podem estar contidos em uma narrativa de aparência sempre simples.
A imensidão aparece bruta e teatralizada. É o palco em que o homem se desloca, transformado em um fator a mais entre um emaranhado de forças elementares e caprichosas. O artista encontra aí, na incontrolável dinâmica do mundo selvagem, um espelho para os recantos menos visitados da alma humana, impulsos que insuflam o “momento histórico muito confuso” que vivemos, como ele define na Entrevista ao Dossier.
Dois fatores concorrem para a dissolução da identidade individual nesse universo talhado tão-somente pelo mar, pelo vento e pela vegetação: o uniforme e a camuflagem. Intimamente ligados e indissociavelmente relacionados a noções de poder, defesa, combate e morte, a indumentária militar e seus artifícios fascinam Fabra Guemberena. Os exercícios, a divulgação de imagens oficiais de conflitos recentes, o “teatro de guerra” encarado como tal – e, portanto, representado dentro de uma série de cenografias – são os motes das investigações do autor, que objetiva, segundo afirma, construir uma “caligrafia da violência”.
Juan-Pedro Fabra Guemberena é o último criador apresentado dentro da curadoria (A)Pareço, logo existo do FF>>Dossier, série que detalhou a obra de quatro artistas uruguaios que têm o simulacro, a sedução pela imagem e a manipulação de códigos e táticas midiáticas contemporâneas como ferramentas e/ou fundamentos de seus trabalhos.
“Como os pintores, Fabra trabalha na tradição da imagem ótica e até poderia dizer: ‘Pinto sem pintar’”, analisa o crítico Ángel Kalenberg em Ensaio presente nesta edição sobre o autor. “As imagens que cria expressam os mesmos terrores que se anunciam nas esculturas das catedrais góticas alemãs. Talvez sejam a projeção do mundo infantil angustiado que lhe coube viver.”
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