Vincent Carelli & Dominique Gallois

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postado em 28/08/2014
Apagamento de tradições pelo contato com o homem branco

O cineasta e indigenista franco-brasileiro Vincent Carelli fundou, em 1986, a ONG Vídeo nas Aldeias (VNA), que atua na formação de cineastas indígenas. Ao garantir acesso a equipamentos, suporte pós-produção e distribuição internacional das obras em vídeo, a VNA almeja a democratização da produção audiovisual de modo a permitir que minorias étnicas se expressem por meio dela.


É neste sentido que a antropóloga Lilia Schwarcz elogia a criação do filme A Arca dos Zo’é (1993) em ensaio publicado no livro Memórias Inapagáveis: “Nesse vídeo os realizadores indígenas é que orquestram suas percepções, escolhem personagens e se reinventam a partir do cinema. A câmera registra uma temporalidade própria, uma outra cumplicidade ou intimidade. Num momento em que o mundo anda perspectivado, esse tipo de material mostra como há formas diversas de pensar, classificar e representar o mundo”.

A Arca dos Zo’é documenta a viagem de Wai Wai, chefe da tribo Waiãpi (Amapá), e sua equipe de filmagem até a aldeia dos Zo’é, no Pará. Wai Wai teve contato com a cultura dos Zo’é por meio da série de vídeos de Vincent Carelli chamada O Espírito da TV. Os Zo’é lhe pareciam manter tradições já perdidas em sua tribo e a intenção de Wai Wai era levar aos jovens da tribo as imagens dos seus ancestrais, segundo Carelli conta à PLATAFORMA:VB.

A curiosidade dos Waiãpi e dos Zo’é é mútua e reflete a diversidade das nações indígenas brasileiras, frequentemente homogeneizadas por nossa história. Wai Wai se espanta com a nudez dos Zo’é que, por sua vez, ficam interessados nas vestimentas dos Waiãpi. “Eles não usam pratos, apenas cuias, como os nossos antepassados​​. Fomos nós que mudamos depois de conhecer os brancos. Eles são idênticos àqueles dos tempos do criador”, conta Wai Wai de volta à sua tribo, que se reúne diante da TV para assistir às filmagens.O chefe Wai Wai adverte os Zo’é sobre os aspectos destrutivos do contato com os brancos, que fazem buracos nas florestas, sujam seus rios e levam doenças aos índios.

Vincent Carelli participou de quatro edições do Festival Sesc_Videobrasil e tem três obras incluídas na coleção da Associação. Incorporado ao acervo em 1994, por meio da 10ª edição do Festival, A Arca dos Zo’é tem direção de Vincent Carelli em parceria com Dominique Gallois, antropóloga que assessora comunidades indígenas no Pará e no Amapá. Por sua intimidade com as populações locais e seus idiomas, Gallois desempenhou importante papel na tradução do diálogo entre os indígenas. O vídeo recebeu prêmios no 9º Festival Rio-Cine (1993), no 16º Tokyo Video Festival (1993) e no 16º Cinéma du Réel (1994), entre outros.


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