O B∆NQUETE

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postado em 22/04/2019
Peça de Ana Pi é apresentada na 2ª Temporada de Dança Videobrasil

A Temporada de Dança Videobrasil comissiona artistas da dança a cada dois anos, em projetos que travam diálogo com o acervo da Associação Cultural Videobrasil, em plena atividade desde 1983. Considerando o arquivo como um organismo vivo, o Videobrasil abre espaço para que seu acervo seja atravessado por variações de corpo e coreografia, confirmando sua pertinência histórica e atualidade. 

Artista participante da 1ª Temporada e curadora desta edição do programa, Clarissa Sacchelli convidou Ana Pi, dançarina radicada em Paris há oito anos, para um período de três meses de residência e criação de um trabalho coreográfico inédito.

A partir de janeiro de 2019, Pi fez uma seleção de sete vídeos do Acervo Histórico Videobrasil, que serviram como referência conceitual e afetiva para seu novo trabalho, O BΔNQUETE, um encontro de mulheres negras na cozinha que convida à reflexão sobre as noções de herança, afeto e resistência, com apresentações no CCSP e na Galeria Vermelho, dentro da programação da mostra de performance arte VERBO 2019.

Nos meses seguintes, os resultados do programa serão apresentados em outras cidades e países graças à parceria com instituições do Brasil e do exterior. Em anos intermediários ao comissionamento, a Temporada de Dança exibe ainda uma programação de filmes de dança, entre outras atividades. 

A Temporada de Dança Videobrasil é um projeto da Associação Cultural Videobrasil e do Estúdio Baile, em parceria com a VERBO e com apoio da Electrica Cinema e Vídeo. A 2ª Temporada é realizada com a importante colaboração do Institut Français du Brésil e do Consulado Geral da França em São Paulo, além de contar com o apoio do espaço Fonte.
 

Serviço
09 julho (ter) às 21h | Galeria Vermelho | O BΔNQUETE
12 julho (sex) às 20h | CCSP / Sala Adoniran Barbosa | O BΔNQUETE
12 julho (sex) às 21h | CCSP / Sala Adoniran Barbosa | Conversa com a artista Ana Pi, a curadora Clarissa Sacchelli, a filósofa Maria Fernanda Novo, com mediação de Ruy Luduvice, coordenador de pesquisa do Videobrasil.
 

Sobre O BΔNQUETE
Obra comissionada pela Associação Cultural Videobrasil para a 2ª Temporada de Dança Videobrasil

Em O BΔNQUETE (380 a.C.), durante uma festa, Platão trava um diálogo, somente entre homens, sobre “O Amor”. Ana Pi, em 2019, convida Mylia Mary, sua tia paterna, para juntas cozinharem uma receita icônica da culinária brasileira e discutirem sobre “O Amor”, durante uma tragédia. A intimidade em torno da cozinha – nome também atribuído ao grupo de percussionistas em uma “Roda de Samba” –, da comida e da dança serve de pretexto para que essas mulheres negras possam dialogar sobre “O Brasil” de hoje. O BΔNQUETE aqui proposto convida à reflexão sobre as noções de herança, afeto e resistência. Trazer à memória elementos imprescindíveis à vida, tais como o alimento, o ritmo e o amor é um exercício de beleza radical.

Criação | Ana Pi
Com | Ana Pi, Mylia Mary 
Música de & com | Aishá Lourenço
Figurinos | Remexe - Centro Cultural Lá da Favelinha
Conselhos filosóficos | Profa. Dra. Maria Fernanda Novo
Produção Brasil | Ubuntu Produções
Produção França | Météores • Plateforme Chorégraphique
Agradecimentos | Dona Alexina e família, Tio Vicente, Priscila e Wudson, Kdu dos Anjos, Carla & Mili, passista Ana Cristina e toda equipe Lá da Favelinha, Cida Moura, Taata Mutá Imê, Clarisse Valadares, Amina Jorge, Laura Fresno, Iza e Biel,  Marion Hesser, Reino de Txonga, Amara Francisca, Iva Francisca, Julieta Lourenço, Ivete Lourenço, Ivonete Lourenço, Ivo Francisco, Omar da Rocha, Jaque Cunha.

Dedicado especialmente a Julio de Oliveira e Sálua.

Sobre Ana Pi (Belo Horizonte, 1986)
Artista da imagem e da coreografia, dançarina contemporânea e pedagoga, pesquisadora-conferencista-performer em danças periféricas e também colaboradora em projetos de diversas naturezas. Passou por mais de uma dezena de países da América, África, Ásia e Europa, onde desenvolveu sua experiência profissional através de programas de residência artística, oficinas sobre corpo, imagem, gestos sagrados e periferia, ou dentro da programação de festivais internacionais, como intérprete em turnês de seu próprio trabalho. Entre suas últimas produções, está o documentário NoirBLUE – deslocamentos de uma dança (2018, 27’), apresentado e premiado em festivais nacionais e internacionais; NoirBLUE (2017), espetáculo para palco que circulou por França, Portugal e Bélgica; COROA (2018), instalação performática apresentada na mostra VERBO (2018) e Lafayettes Antecipation – Paris (2018). No mesmo ano recebeu o prêmio de Revelação da Dança pela Cooperativa Paulista de Dança. É coreógrafa associada ao MAC - Val & la Briqueterie CDCN para o projeto europeu Dancing Museums, além de colaboradora em dança do Centro Cultural Lá da Favelinha desde 2015. Atualmente além de criar O BΔNQUETE para a 2ª Temporada de Dança Videobrasil, participa do longa-metragem de animação Ana, en passant, de Fernanda Salgado.

Mylia Mary
Nascida em 1954, em Belo Horizonte (MG), é tia paterna da artista Ana Pi. Foi passista da Escola de Samba Unidos do Rosário. Casada, mãe de dois filhos, hoje dedica-se ao ofício de salgadeira, uma respeitada e querida cozinheira proprietária do seu próprio negócio.

Aishá Lourenço
Originária de Olinda e nascida em 1984, sua linguagem abriga desde a percussão convencional e artesanal a aparatos digitais e tecnológicos. Trabalhou com artistas como Naná Vasconcelos (PE), Johnny Hooker (PE), Nitin Sawnneye (Reino Unido), Mamadou e Marian (Mali). Atua como facilitadora musical no Brasil e no exterior, tendo atuado com crianças com necessidades especiais e mulheres refugiadas, além de se dedicar como artista-orientadora do Programa Vocacional, em São Paulo.

 

Obras do Acervo Histórico Videobrasil selecionadas por Ana Pi como referência para O B∆NQUETE

A Dama do Pacaembú
1983, 34’32’’| Rita Moreira (Brasil, 1944), Maria Luísa Leal (Brasil)
Retrato de Geralda, mulher em situação de rua que vive na avenida Pacaembu, em São Paulo, rodeada por mansões. E, no canteiro que escolheu para instalar seu lar, discorre sobre temas variados como moradia, dívida externa, seus vários casamentos com homens de nomes aristocráticos ou a situação dos sem-teto, numa verdadeira palestra que desconcerta o público. A obra possui distorções na imagem e no som por conta do estado da fita de vídeo magnética (a única existente), a partir da qual foi digitalizado.

A Situação 
1978, 8’50’’ | Geraldo Anhaia Mello (Brasil, 1955 - 2010)
Sentado atrás de uma bancada e vestindo terno e gravata, um personagem ensaia um diagnóstico sobre a situação política, social, econômica e cultural brasileira, mas é continuamente interrompido por fartos tragos de uma garrafa de cachaça. Seu figurino, o texto e o enquadramento em plano médio satirizam os trejeitos e expedientes que supostamente garantem credibilidade ao discurso dos âncoras de telejornal, preparando o expectador para recebê-lo como verdade cabal. Aqui, no entanto, aquilo que é pressuposto como um dado objetivo pela fala do apresentador — o Brasil enquanto experiência social compartilhada — é descontruído e denunciado em seu caráter ideológico.

Quando o Crioulo Dança? 
1988, 30’36’’ | Dilma Loés (Brasil, 1950)
Documentário sobre o racismo no Brasil por ocasião dos protestos contra os 100 anos de farsa da abolição da escravidão realizados pelos movimentos negros em 1988. Apresentando depoimentos e entrevistas com a população e ativistas dos movimentos nas ruas do Rio de Janeiro, o vídeo questiona a ideia de democracia racial no Brasil, circulada internacionalmente, desvelando as diversas formas de manifestação do racismo estrutural que ainda assolam a população negra do país. Entremeiam os depoimentos e cenas dos protestos trechos ficcionais nos quais a dança de um homem negro remete às violentas situações de discriminação onde o negro “se dá mal”. Realizado no período da redemocratização brasileira, quando Dilma Lóes participava ativamente da construção do SOS Cidadania e Racismo no Instituto de Pesquisas das Culturas Negras do Rio de Janeiro.

Samba do Crioulo Doido 
2013, registro de performance, 19’44’’ | Luiz de Abreu (Brasil, 1963) 
A discriminação racial e sua incidência no corpo negro é o centro da peça performática. A partir de elementos indefectivelmente associados ao negro brasileiro — samba, Carnaval, erotismo —, e de referências à pátria branca, o artista cria imagens que falam do racismo, da transgressão como forma de resistência e da importância do corpo na construção da identidade. Valendo-se da ironia e do deboche, a performance busca devolver ao corpo-objeto o sujeito roubado, com sentimentos, crenças e singularidades. A obra recebeu o Grande Prêmio no 18º Festival de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil, em 2013.

merci beaucoup, blanco!
2017, 9’20’ | Musa Michelle Mattiuzzi (Brasil, 1983)
A expressão “merci beaucoup, blanc!” tem origem latina e, na França, é usada para designar gratidão. Ao adicionar a “blanc” (que significa branco em francês) a letra “o”, a palavra se aproxima do português “branco”. Na obra, a artista pinta o próprio corpo negro com tinta branca, propondo uma reflexão sobre a linguagem como ferramenta de propagação do racismo. Movendo-se entre a fotografia, o cinema e a ação ao vivo, Mattiuzzi elabora uma estratégia poética de afirmação das lutas políticas na vida cotidiana de comunidades racializadas.

A Arca dos Zo'é
1993, 21’28’’ | Vincent Carelli (França, 1953), Dominique Gallois (China, 1950)
De avião, um grupo de índios da tribo Waiãpi visita a remota aldeia dos índios Zoé no interior do Pará e leva consigo imagens gravadas em vídeo sobre sua própria tribo, relatando costumes e seu modo de vida. Durante a estada na tribo Zoé, o grupo documenta também a vida local e mostra suas diferenças.

Lo Sublime / Lo Banal 
2004, 12’37’’ | Graciela Taquini (Argentina, 1941)
A artista prepara uma sobremesa com uma amiga e rememora o dia de 1971, em que as duas conheceram o escritor Julio Cortázar no fundo de uma pizzaria em Paris. Realizado em plano-sequência, a tomada única envolve o espectador num fluxo de consciência cadenciado pelo bater do creme e do recheio, fazendo com que o sublime do mundo cortazariano se instale em meio ao ambiente doméstico e à atividade prosaica, num pacto simbólico e afetivo entre as duas senhoras. 

 

Ficha técnica
2ª TEMPORADA DE DANÇA VIDEOBRASIL
Realização | Associação Cultural Videobrasil
Concepção e coprodução | Estúdio Baile
Direção | Thereza Farkas
Curadoria | Clarissa Sacchelli
Artista convidada | Ana Pi
Coordenação de pesquisa | Ruy Luduvice
Produção | Clarissa Ximenes e João Simões
Agradecimentos | Carolina Mendonça, Louis Logodin, Marcelo Amorim, Marcos Gallon, Maurício Ianês, Nino Cais, Simone Moraes, Telma Baliello, Equipe Galeria Vermelho, Equipe Centro Cultural São Paulo

Sobre o Estúdio Baile
O Estúdio Baile concebe e realiza projetos artísticos de natureza híbrida, partindo sempre das artes visuais para se conectar a outras linguagens, como dança, teatro, artes gráficas, música, cinema e literatura. Nasce com o intuito de fomentar e viabilizar iniciativas que, por se afirmarem num lugar-entre as diferentes manifestações artísticas, pouco encontram recursos ou estratégias para o desenvolvimento de suas pesquisas e para a produção e circulação de suas práticas. Além das propostas concebidas internamente, o Estúdio também oferece consultorias e realiza projetos sob encomenda, desde sua concepção e produção até articulações institucionais.