Depoimento 2019
Transcrição de depoimento para a 21ª Bienal
A presença de rituais comunitários, políticos ou religiosos, no meu trabalho se deve em parte ao meu interesse por dinâmicas de grupo de diferentes comunidades, pela solidariedade que elas criam, pelo modo como são desempenhados e sua capacidade de transformação da sociedade como um todo. O essencial para se entender as comunidades são os rituais coletivos ou as apresentações que elas realizam regularmente. A palavra “ritual” não deveria nos assustar. Não é uma palavra usada apenas para descrever tradições antigas. Os rituais acontecem aqui e agora.
A obra Binibining Promised Land é uma combinação do meu trabalho como artista e do trabalho com a comunidade. O filme principal é minha representação das candidatas do concurso de beleza em sua apresentação mais comum. As três entrevistas são conversas quase sem edição que tive com indivíduos da comunidade – de modo que ouvimos suas histórias em suas próprias palavras. As capas de revista são trabalhos exclusivamente seus. Isso é algo próximo do espírito de solidariedade que experimentei na comunidade deles e em outras similares onde trabalhei na Turquia e em outros países. Então, eu poderia dizer que este é um trabalho com o qual aprendi a abrir mão do ego de artista.
Meu interesse em guetos ou espaços privados, que são isolados dos olhos do público, começou ao observar manifestações de comunidades em diferentes lugares. Por exemplo, quando eu estava fazendo um trabalho sobre os rituais matrimoniais de imigrantes turcos e curdos em Berlim, percebi que os salões de casamento ficavam escondidos em grandes edifícios, longe do público alemão. Quando perguntei a uma convidada por que eles escolhiam se fechar naqueles espaços privados, ela me respondeu que aquele era um isolamento voluntário.
O mesmo ocorre no filme que vocês veem na 21a Bienal: esse concurso de beleza acontece em uma casa noturna, no subsolo mais inferior de uma enorme estação de ônibus – a segunda maior do mundo. O significado dessa estação é que, embora tenha sido construída nos anos 1980 para o público israelense viajar, a maioria deixou de usá-la devido aos ataques. O gigantesco complexo se tornou um espaço que comunidades migrantes podem reivindicar como seu espaço e onde podem se expressar livremente, por meio de seus rituais e eventos. Aqui podemos ver a cultura dessas comunidades resumida. Fora dali eles se transformam no ambiente; ali dentro eles transformam o ambiente à sua própria maneira.