Ensaio Eduardo de Jesus, 04/2006

Imagem Política

A produção audiovisual contemporânea desliza como um fluxo entre os mais diversos caminhos e possibilidades de criação. Os múltiplos processos de construção imagética servem para explicitar os diversos vetores, linhas de força e de continuidade que, de alguma maneira, reforçam os vínculos de uma espécie de história do audiovisual (ou uma “Arqueologia dos meios”, como afirma Siegfried Zielinski). As heranças da videoarte, do cinema novo, das vanguardas e do primeiro vídeo são freqüentemente rearticuladas em novas produções que se propõem refletir os descaminhos do dispositivo audiovisual e de suas manobras em torno dos estilhaços da realidade.

Os vídeos de Daniel Lisboa estão situados em uma destas linhas de continuidade que unem, às vezes de forma quase paradoxal, a imagem composta de modo experimental com princípios formalistas e a inquietude de uma visão política e anárquica do evento social, especialmente da situação política e social da Bahia. Lisboa parece herdar o modo de operar do aparato técnico das vanguardas históricas da década de 20 ou do primeiro vídeo, nos anos 60, e a inquietude dos realizadores que logo depois migraram para as TVs experimentais e comunitárias que marcaram a produção audiovisual dos Estados Unidos nos anos 70. Parece que a obra de Lisboa pertence a essas duas linhas que muitas vezes se mostraram excludentes, como nos mostra Martha Rosler em seu ensaio “Video: Shedding the Utopian Moment” publicado na coletânea Ilumminating Video* :

A tentativa de usar o vernáculo principal e o meio popular teve diversos caminhos. O esforço da inspiração ou influência surrealista significou o desenvolvimento de uma nova poesia da linguagem cotidiana da televisão, para introduzir um prazer estético dentro do comportamento de massa e fornecer um lampejo utópico proporcionado pelas sensibilidades liberadas. Isso significou não somente o estético hedônico enquanto pausa de uma realidade instrumental, mas também enquanto manobra liberalista. Um outro caminho estava mais interessado na informação do que na poesia, menos interessado na transcendência espiritual, mas igualmente ou mais interessado na transformação social. Sua dimensão política foi mais coletiva, menos visionária, em seu esforço de aumentar o espaço para que as vozes dos sem-vozes pudessem ser articuladas. 

No caso do trabalho de Lisboa essas duas correntes se misturam em vídeos que, se de um lado tratam a imagem formalmente, de outro acabam por revelar questões políticas e sociais. O que destaca nessa mescla - e que nos faz lembrar dos vídeos de Paul Garrin, especialmente Home(less) Is Where the Revolution Is (1990) - é justamente usar procedimentos formais mais típicos do vídeo experimental fundidos com elementos do documentário, explicitando uma tensão natural entre a imagem, sua forma e os conteúdos sociais apresentados. Na produção de Daniel Lisboa podemos ver isso nitidamente em U Olhu Du Povu, Freqüência Hanói e em O Fim do Homem Cordial, vídeo premiado na 15ª edição do Festival Internacional de Arte Eletrônica Videobrasil.

O grande plano-seqüência com imagens em preto-e-branco de pessoas comuns na rua, que aparece em quase toda a duração de U Olhu Du Povu, revela um tratamento estético interessante. As pessoas são recortadas do fundo, que se torna um mero vestígio, marca tênue do lugar. Essa imagem do fundo solarizado, com as pessoas à frente, parece uma cópia xerox do espaço real, reconstrução piorada, não fidedigna e que já se mostra falida na possibilidade de revelar alguma coisa. Pura construção imagética. Assim somos embalados, em ritmo lento, pela música de Chico Science (Coco Dub) e pelas imagens de pessoas que olham perplexas. A tensão continua até os últimos minutos do vídeo, quando vemos que se trata de uma manifestação de estudantes, partidos de esquerda e populares nas ruas de Salvador, durante o processo de cassação do Senador Antonio Carlos Magalhães, figura central na política mais conservadora do Estado da Bahia, devido ao escândalo de alteração do painel eletrônico. O depoimento de uma mulher no final do vídeo colabora para que as imagens do povo agora ganhem um novo sentido. Perplexidade, passividade e assombro. Lisboa soube captar esse sentimento e, de forma bastante instigante, constrói uma espécie de narrativa que culmina com o motivo de tamanho espanto por parte das pessoas. 

Já no inquietante Freqüência Hanói, co-dirigido com Diego Lisboa, a beleza das imagens do céu intensamente azul cortado por fios elétricos, antenas e outras “gambiarras urbanas” serve para revelar um discurso franco de um presidiário (será mesmo?) que narra sua história, suas indignações e sonhos. Durante todo o vídeo, a voz do presidiário é interrompida pelos ruídos de sintonia, como se fosse um rádio. O interessante é que a interferência também alcança a imagem que, nestes momentos, torna-se uma tela preta e algumas vezes revela pequenos fragmentos de imagens. Como lampejos, muito rápidos, vemos imagens de uma delegacia e de pichações. Sintonias que se encontram no discurso político indignado do presidiário e nestas imagens que recortam o azul do céu. Neste jogo entre perder e encontrar a sintonia, Lisboa dá voz aos que normalmente não conseguem alcançar os meios. 

O resultado é pura potência, revelação do estado das coisas, principalmente na política, na Bahia e no Brasil. As imagens não mostram o presidiário e, com isso, não se estruturam em torno de uma representação do real, fazendo com que as possibilidades de sintonias desta “imagem-rádio-voz” nos revelem, em profundidade, uma voz que não estamos acostumados a ouvir com freqüência. Voz que normalmente se perde nos grandes meios de comunicação. 

Se em Freqüência Hanói essa voz que ganha espaço é a do presidiário, em O Fim do Homem Cordial a ficção desenvolvida em torno de um dispositivo terrorista revela a furiosa voz marginal dos excluídos. O vídeo desenvolve-se com a apropriação de imagens do noticiário vespertino da principal emissora da capital baiana e, assim como os terroristas da rede Al-Qaeda, solicita a exibição de material que enviaram para a emissora sobre o seqüestro de um conhecido senador baiano. O que se vê é de uma contundência brutal e parece nos esfregar na cara o assombro da vida de milhares de brasileiros que são constantemente afetados pelas manobras corruptas dos políticos. Ao assumir o vídeo como um dispositivo terrorista (imagem que invade a programação, ausência de movimentos de câmera, violência no discurso, baixa qualidade da imagem, interferências visuais de toda ordem), Lisboa parece subverter o lugar do audiovisual e se referir a uma realidade construída na mediação e da qual a imagem já faz parte. Nessa apropriação subversiva das imagens, surge o discurso “pouco cordial” daqueles que normalmente não têm voz. “Cabeça branca vai rolar” grita o “terrorista baiano” exibindo impávido, para a câmera, o facão. Lisboa explicita ainda mais o dispositivo terrorista ao sutilmente mudar as legendas de inglês para árabe e ao incluir uma trilha também árabe no fim do telejornal. Estratégia de assumir o vídeo como um dispositivo que se coloca na violenta situação de forjar o real, de revesti-lo de ficção para, assim, talvez, conseguir ver o alcance dos seus estilhaços de imagem. Curto-circuito da mídia e imagem como vestígio do real midiático.

A obra de Lisboa revela, de forma bastante contundente, uma vertente da produção audiovisual brasileira que oscila entre formatos e gêneros, absorvendo, na multiplicidade imagética atual, possíveis situações de subversão, recriação e apropriação, como, por exemplo, a televisão em seus agenciamentos (notícia, informação, entretenimento, entorpecimento), em O Fim do Homem Cordial, ou a tensão entre documentário, ficção e experimentação, em Freqüência Hanói.

Além disso, as tensões típicas do encontro com o Outro, reveladas nas obras, fazem parte de um repertório de estratégias para nos envolver como espectadores e colocar em conflito diferentes visões do mundo. O resultado é o impacto de uma produção intensamente conectada com a vida social que consegue dar voz ao Outro explicitando assim, de forma contundente, as questões políticas brasileiras que muitas vezes são boicotadas nos noticiários nacionais.

Entrevista Teté Martinho, 04/2006

Para você, o objetivo de quem realiza um filme com a característica do confronto “é envolver o público no meio do tiroteio”. Desde quando a idéia de confrontar é um norte em seu trabalho? Como você avalia, nesse aspecto, sua evolução de U Olhu Du Povu e R$ 1,50 para O Fim do Homem Cordial?

O público já está no meio do tiroteio, sempre esteve. A intenção é fazer com que ele perceba a existência do tiroteio. O sistema de opressão é sofisticado, anestesia a população de tal forma que já não se pode perceber com clareza os fatos, entender os acontecimentos e apreender o confronto.

No meu trabalho, o confronto começa no momento em que a cidade se revela, quando o jovem artista também se vê no meio da batalha e o processo criativo não consegue estar desassociado da luta detectada. Por isso essa característica política, social e violenta na primeira etapa do meu trabalho, a fase universitária, que já começa a se transmutar.

De U Olhu Du Povu e R$ 1,50, registros de espasmos populares, até O Fim do Homem Cordial, pude traçar uma radiografia social e política do confronto no Estado. O Fim do Homem Cordial nada mais é do que uma previsão, uma antecipação dos fatos, o inevitável, o caos futuro, o fim da cordialidade de um povo que não suporta mais sua miserabilidade.

“Aprendemos na TV o Terrorismo Audiovisual e vamos executá-lo”, diz um dos mandamentos do Manifesto Cinematográfico Anticordial. Como você chegou ao formato de O Fim do Homem Cordial?

Em Salvador existe um império audiovisual formado pela TV Bahia e pela TVE. As duas emissoras estão a serviço do governo do Estado e, em conseqüência, a serviço de Toninho Malvadeza (ACM). A informação audiovisual é manipulada, verbas são desviadas para propagandas políticas que infestam os espaços comerciais. O apadrinhamento, a panela, a cultura dos compadres é o que predomina. A província está dominada. 

Da mesma forma como, no sistema globalizado, o terrorismo ataca o império, no nosso contexto, o Terrorismo Audiovisual ataca o império audiovisual. Como eles, sabemos o poder da imagem. E também sabemos fazer malvadeza, malvadezas audiovisuais como aprendemos na TV com nossos amigos do Oriente Médio. 

O Fim do Homem Cordial é um seqüestro audiovisual. Roubamos as imagens produzidas por eles, manipulamo-las e damos outro sentido a elas. Antropofagia audiovisual. O seqüestro foi pago com os R$ 8 mil que ganhamos em um festival realizado pelo governo do Estado. 

Você esperava que O Fim do Homem Cordial gerasse tanto impacto? Como avalia o resultado do processo deflagrado pela censura ao vídeo na Bahia?

O Fim do Homem Cordial foi um trabalho feito com uma finalidade. Uma bomba preparada para explodir em um determinado lugar. Um ataque bem-sucedido, acima das expectativas. Um ato sem precedentes na Bahia. Rachaduras irreparáveis foram causadas na Secretaria de Cultura, na Fundação Cultural e na DIMAS (Diretoria de Artes Visuais e Multimeios). 

Uma nova forma de se relacionar com o audiovisual, sem meias palavras, sem medos de retaliação, insatisfeita e desobediente, foi lançada no universo provinciano, na mesmice, na arte comprada, na cultura turística do Estado.

Não é fácil lidar com esse tipo de arte, que contesta e propõe, que ataca e expõe, por isso a aberração da censura em pleno século 21. O medo de perder o cargo, de desagradar o comandante, gera a anticensura, a burrice de tentar apagar o fogo com gasolina. A forma como a cultura vem sendo tratada na Bahia foi exposta para todo o Brasil.

Até hoje o caso O Fim do Homem Cordial não foi resolvido. O vídeo nunca foi exibido na sala onde ocorreu a censura.

O que você buscou nas personagens retratadas pelo Projeto Figuraça ao escolhê-las? O trabalho foi pensado para a TV? Chegou a ser exibido pelo veículo?

O Figuraça é um catalogo audiovisual dos personagens que compõem o cotidiano da cidade. Toda cidade tem suas figuras, pessoas que se destacam com suas idiossincrasias, e Salvador não é diferente. Tenho fascínio pelas diferentes formas de enfrentar o mundo, a realidade, a cidade, pela variação da moral, pela transvalorização dos valores predominantes. Esses elementos acabam definindo a escolha dos personagens.

O projeto inicialmente foi pensado para a estética televisiva. No entanto, estamos pensando em modificar esse formato. A dificuldade de veiculação é grande e, quando conseguimos exibir, algumas falas dos nossos “figuraças” são cortadas. Isso é inadmissível.

Como foi feito Freqüência Hanói? Que orientação você deu ao narrador?

Freqüência Hanói é um subproduto de um longa-metragem que estamos realizando, eu e meu irmão, Diego Lisboa, sobre um rapper baiano especialista em invadir palcos de bandas grandes para mostrar seu trabalho... “Um ladrão de microfones.”

Com alguns elementos desse longa construímos Freqüência Hanói. Juntamos as ligações telefônicas realizadas pelo rapper da penitenciária para nossa casa, através de um celular clandestino, com as imagens dos fios telefônicos de nossa ida até a penitenciária.

Não houve orientação durante as ligações. Apenas avisávamos ao detento que estávamos gravando.

Através das novas tecnologias, nosso personagem derruba as barreiras físicas, liberta seus pensamentos e nos proporciona uma visão interna do sistema penitenciário.

Freqüência Hanói está dentro do Terrorismo Audiovisual, pois constitui um crime imagético.

Quais são seus projetos e prioridades, no momento? O Movimento Anticordial continua articulado?

1. Continuar realizando meus vídeos caseiros (orçamento zero).

2. Continuar realizando o Figuraça.

3. Continuar colocando projetos em editais para realizar os mais complexos (com orçamento).

4. Continuar fazendo VJ (projeções) no underground.

5. Teorizar e executar o Terrorismo Audiovisual.

6. Lutar pela sobrevivência do MovAC - Movimento Anticordial. 

Biografia comentada Eduardo de Jesus, 04/2006

A produção do baiano Daniel Lisboa (Salvador, 1980) se distingue pela vocação política e por uma compreensão particular do poder mobilizador da imagem. De um olhar melancólico, quase fatalista, diante da subserviência política - a chamada cordialidade brasileira, seu tema-chave -, o artista evolui para um uso do vídeo que, em vez de se alinhar às formas regulares de militância da esquerda, empresta, não sem ironia, a crueza das estratégias de difusão do terror contemporâneo. Com O Fim do Homem Cordial (2004), que concretiza de forma contundente a idéia de “Terrorismo Audiovisual”, conquista reconhecimento (como o Prêmio Novos Vetores, no 15º Festival Internacional de Arte Eletrônica Videobrasil) e causa incômodo: a obra é retirada da Mostra de Vídeo Jovens Realizadores Baianos, em Salvador, num escandaloso episódio de censura.

Precedida por experiências caseiras e videoclipes - aos 15 anos, Lisboa ganha sua primeira câmera -, a opção pela temática política vem do contato não só com a miséria das ruas de Salvador, mas com uma passividade que ao artista parece igualmente ostensiva. O documentário experimental U Olhu Du Povu (2002), sua primeira realização de peso, parte de uma manifestação pública na qual estudantes, militantes e populares pedem a cassação do senador Antonio Carlos Magalhães, então envolvido em fraude eleitoral no Senado, na capital baiana. Com a câmera na mão, Lisboa dá as costas aos manifestantes para registrar o olhar apático de uma multidão que assiste sem participar e sem compartilhar da rebeldia. 

Premiado pela expressão poética, o trabalho carrega o germe de algo que se tornará central nas obras e articulações de Lisboa: a idéia do homem cordial. Para chegar ao termo, o artista se serve livremente da definição oferecida para o brasileiro por Sergio Buarque de Hollanda no monumental Raízes do Brasil: um homem cordial, afável, generoso e hospitaleiro. Refutada por Hollanda, que afinal a considerou “ambígua”, a expressão renasce com o sentido adicional de subserviência política tanto em O Fim do Homem Cordial quanto no nome do Movimento Anticordial, coletivo de intervenção urbana que responde à proibição do filme, e do conjunto de mandamentos do Manifesto Cinematográfico Anticordial, que prega um “cinema brusco, rápido, necessário”, financeiramente independente de editais governamentais e nascido do “contato entre a tecnologia digital e a falta de recursos”.

Até que a idéia por trás de O Fim do Homem Cordial se consolide, porém, Lisboa expande seu olhar em várias direções. Em Um Milhão de Pequenos Raios (2003), documentário musical sobre a guerra de pipas travada entre adultos e crianças na orla da capital baiana nos fins de semana, explora sua afinidade com a música eletrônica e com a coreografia das ruas de Salvador. No mesmo ano, exercita seu fascínio pela riqueza humana da cidade no Projeto Figuraça, portfólio de personagens soteropolitanos peculiares, como Seu Marinho, aposentado que se autoproclama guarda de trânsito, e Pimentinha, dono de bar que recebe os clientes com passes de candomblé. Ainda em 2003, registra a semana de manifestações que se seguem a um aumento da tarifa do ônibus urbano na cidade, no documentário R$ 1,50.

Os manifestantes que transformam a cidade em caos para protestar contra as tarifas de ônibus em R$ 1,50 e os cidadãos que vociferam contra a elitização do carnaval baiano em Projeto Figuraça estão longe de ser exemplos de cordialidade - tampouco prenunciam a virulência do ataque feito à figura de proa do coronelismo baiano por O Fim do Homem Cordial. Dirigida contra Antonio Carlos Magalhães e seus mecanismos de sustentação política, a primeira ficção de Lisboa põe em prática todos mandamentos do cinema anticordial: encena o seqüestro do senador e o pedido de resgate com crueza, e se constrói a partir de um “seqüestro audiovisual” - a apropriação e manipulação de imagens da TV Globo baiana. “Da mesma forma como, no sistema globalizado, o terrorismo ataca o império, no nosso contexto, o Terrorismo Audiovisual ataca o império audiovisual”, diz Lisboa. “Como eles, sabemos o poder da imagem.” 

Além de seus méritos óbvios - como o fato de usar a precariedade como linguagem, a favor do teor virulento da mensagem -, O Fim do Homem Cordial nasce de um achado: a idéia de confrontar um poderio político cuja longevidade deve muito ao controle dos meios de comunicação com a prática aqui inusitada, mas comum entre grupos terroristas palestinos, de usar a TV para enviar mensagens e divulgar ações. O poder da mistura pode ser medido pela reação que provocou: um episódio de censura bizarro - o vídeo foi retirado às pressas da Mostra de Vídeo Jovens Realizadores Baianos -, que resultou no afastamento de Sérgio Borges do cargo de diretor de Artes Visuais e Multimeios da Fundação Cultural da Bahia.

A O Fim do Homem Cordial, seguiram-se vários prêmios em festivais brasileiros, além de uma onda de ações do Movimento Anticordial, grupo de artistas que organizam atos em protesto à censura do filme, e para estimular o debate público sobre política, arte, comportamento, meio ambiente, urbanidade e comunicação. Divisor de águas, a obra trouxe Lisboa para uma trilha mais próxima da criação artística que do documentário militante. Freqüência Hanói, o vídeo que conclui em seguida, contrapõe as falas de um homem que está preso em uma penitenciária baiana, colhidas a partir de uma ligação feita por celular clandestino, a imagens randômicas de um céu que escurece, cruzado por fios de alta tensão e observado desde um carro em movimento. Da incursão radical à ficção, o artista parece ter voltado mais livre.

Referências bibliográficas

Informativo MovAC 
As ações coordenadas pelo MovAC (Movimento Anticordial) são o tema do boletim, atualizado em novembro de 2005. Textos e imagens registram e analisam o saldo de cada ato do coletivo, que usa teatro, vídeo, fotografia, grafite, música, poesia e performance para explorar novas possibilidades de ocupação dos espaços da cidade.

Manifesto Cinematográfico Anticordial
Professa os 13 princípios norteadores da produção de Lisboa a partir de O Fim do Homem Cordial, incluindo a busca de independência financeira em relação a editais governamentais, a eleição da miséria e da violência política como temáticas fundamentais e a opção pelo “terrorismo audiovisual”.