Um sorriso permanente acompanha a obra de Paula Delgado. Não como manifestação de alegria, menos ainda de cumplicidade e, definitivamente, longe de denotar qualquer satisfação. Como o gato de Alice, os trabalhos da artista, à primeira vista cândidos, lúdicos e familiares, crescentemente intrigam o espectador, na medida em que – à guisa de respostas às perguntas que se formulam – astutamente devolvem ao interlocutor sua própria realidade, rearranjada dentro de moldes insólitos.

Imersa em “um mundo cheio de clichês até o cansaço”, como descreve em entrevista ao Dossier, Delgado tem nas relações de gênero as molas propulsoras de sua investigação. Os tons desafinados e, no outro extremo, as melodias tidas como perfeitas na sinfonia cotidiana constituem sua matéria-prima preferida. A ficcionalização – ostensiva – dos ditames culturais da atualidade é sua principal ferramenta. A artista integra a série (A)Pareço, logo existo do FF>>Dossier, ao lado de três outros autores uruguaios que também têm o simulacro, a sedução pela imagem e a manipulação de códigos e táticas midiáticas como instrumento ou fundamento de seu trabalho.

A crítica de Delgado a modelos consagrados de comportamento, receitas de sucesso e “verdades” subentendidas aflora em propostas tão distintas quanto Candy, Queen of Karaoke – em que a autoconstrução de uma aspirante ao estrelato resulta amadora e deprimente –, Karina, que materializa uma reação feminina ao assédio sexual, e Cómo sos tan lindo, quando rapazes comuns tornados “homens-objeto” se mostram frágeis, inseguros e desconcertados.

Em todos, como observa o crítico Enrique Aguerre em Ensaio escrito para este Dossier, a autora “enfrenta criticamente um estado das coisas que devem ser revisadas e transformadas sem mais demora”.

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