Biografia comentada Paula Alzugaray, 06/2007

Luciano Mariussi inicia sua trajetória artística pela porta da gravura, realizando uma exposição individual no Solar do Barão, em Curitiba, em 1996, e participando de exposições coletivas, como Gravadores Contemporâneos do Paraná, no Paço Imperial, do Rio, em 1997, e a Mostra Rio Gravura, no Museu da República, em 1999. A situação confortável propiciada pelo meio, no entanto, é logo colocada em xeque, na medida em que o artista se define por uma pesquisa com arte e tecnologia. “No meu trabalho com gravura, sentia muita receptividade por parte do público. Mas as respostas que obtive foram raramente mais aprofundadas e sempre a visualidade era posta em evidência. Depois deste ‘acerto’ visual e fracasso conceitual foi que mudei toda minha pesquisa para a investigação desta relação”, diz o artista.

É um paradoxo que o interesse de Mariussi pelo estranhamento do público diante da arte e das novas tecnologias parta exatamente da relação de amor que este mesmo público tenha estabelecido diante de sua obra gráfica. Mas assim aconteceu e essa relação, antes calcada sobre o prazer da visualidade, é então convertida numa espécie de confronto. “Estranhamento” passa a ser a palavra-chave que orienta a pesquisa de Mariussi a partir da realização do vídeo Não entendo, em 1999. Nesse trabalho, o artista se apropria dos mecanismos de realização de uma reportagem televisiva, subvertendo-os ao abordar transeuntes na rua com perguntas sobre arte em idiomas estrangeiros. Ou seja, qualquer familiaridade que o entrevistado possa sentir em relação a uma hipotética abordagem jornalística é instantaneamente revertida em uma reação de estranhamento.

Configura-se aqui uma crítica metalingüística aos discursos artístico e midiático, que abre mão da visualidade e da narratividade e descobre uma raiz conceitual em trabalhos de artistas como Gary Hill, Pierrick Sorin, Tadeu Jungle, Rafael França, Paulo Bruscky e Bruce Nauman. Não entendo, aponta Luciano Mariussi, tem estratégias similares às do vídeo Heróis da decadên(s)ia (1987), de Tadeu Jungle e Walter Silveira, em que um pretenso jornalista inicia entrevistas de rua e surpreende ao não perguntar nada.

A pesquisa que se inicia com Não entendo é uma crítica a duas formas de mediação: aquela que a instituição faz entre a obra de arte e o público e aquela que os meios de comunicação fazem entre o acontecimento e a sociedade. Realizada em princípio no formato de videodocumentários – Não entendo e Estética (2002) –, essa crítica assume depois a forma de intervenções, nos projetos Vitrines, entre 2002 e 2005, e Aluga-se, na Galeria Laura Marsiaj, no Rio, em 2006. Nos documentários, o artista se empenha em evidenciar tanto as lacunas de comunicação entre arte e público quanto as lacunas entre a experiência da realidade e a sua representação. Se Não entendo discute a manipulação da realidade, Estética pensa o discurso sobre a arte e o embate entre espectador e obra.

O teor reflexivo dos trabalhos deu origem à pesquisa de mestrado de Mariussi, concluída em 2005 na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Intitulada Arte X Público: uma leitura poética mediada pela tecnologia, a dissertação reflete sobre como os trabalhos realizados se relacionam com o público, pensando de que maneiras o formato ou a mídia utilizada influenciam nessa mediação.

Em 2005, quando é convidado a dar aulas sobre história e linguagem cinematográfica na graduação de design do Centro Universitário SENAC, Mariussi troca Curitiba por São Paulo. Atualmente, dá aulas também no curso de pós-graduação em cinema, vídeo e fotografia do Centro Universitário Belas Artes.

No curso, o professor Luciano Mariussi pode refletir a respeito de e interagir com uma das questões intrínsecas ao trabalho do artista Luciano Mariussi: a interseção entre cinema e artes visuais. “Nas aulas coloco em prática um exercício mental e uma reflexão acerca dos procedimentos e estratégias da arte contemporânea. Por arte contemporânea entenda-se desde a performance até o cinema digital e as artes via internet”, diz.