MINERVA CUEVAS
DISSIDÊNCIA


Uma mirada sobre o cenário latino-americano das artes não deixa dúvidas: os aspectos coloniais de nossa história e o peso dessa herança nas relações sociais são ainda um tema central na produção de diferentes artistas da região. Nesse contexto, a elaboração de uma poética contundente, que combina ironia e fortes críticas ao sistema capitalista e à bárbara civilização de que nos falou Walter Benjamin, situa a produção da mexicana Minerva Cuevas em uma posição singular, onde a abordagem de disputas sociais do presente articula repertórios da cultura de massas e textos, autores e slogans de diferentes épocas contra o status quo.

Primeira individual da artista no Brasil, Dissidência traz, em um conjunto de nove obras, uma abordagem de sua produção audiovisual. Por esse caráter inaugural, a exposição reúne alguns dos elementos centrais da poética de Cuevas, em que se destacam a relação entre humanidade e natureza – não só no que diz respeito a questões de mercantilização ou preservação do meio ambiente, mas também ao direito de populações originárias e camponesas à terra – e as formas diversas assumidas pela colonização dos imaginários, que opera sempre suprimindo ou neutralizando repertórios culturais dissonantes. Disidencia v. 2.0., obra que empresta seu título à exposição e que encerra o percurso no espaço expositivo, traz um inventário das diferentes marcas deixadas por manifestações populares no espaço público da Cidade do México, resgatando-o (ao menos simbolicamente) como locus de negociação política, em uma espécie de homem com a câmera atualizado e em menor escala. Não se trata, por isso, de uma poética baseada na recusa cínica do presente, mas de um pensamento que parece nos lembrar, como diz Susie Linfield, comentando Benjamin, de que “documentos de sofrimento são documentos de protesto, pois nos mostram o que acontece quando destruímos o mundo”.

A exposição conta, por fim, com um programa de filmes realizado a partir do Acervo Histórico Videobrasil, que busca desdobrar e expandir alguns dos temas abordados por Minerva Cuevas. Desse modo, Dissidência reafirma a vocação do Galpão VB como espaço de reflexão e investigação artística, além de casa para a produção de artistas que, do amplo Sul Global, agem contra o esmagamento de horizontes criativos e políticos, a favor da dissidência e da liberdade.